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Investigação explora a importância das memórias dos/as trabalhadores/as que construíram a capital do Brasil, Brasília, na luta por habitação digna
19 fevereiro 2025
No dia 19 de fevereiro, foi defendida na Universidade Lusófona a tese de doutoramento em Museologia: Os territórios das memórias candangas: remoções urbanas, territorialidades periféricas e imaginações museais no Distrito Federal, Brasil, pela aluna Karolline Pacheco Santos, sob a orientação de Clóvis Carvalho Britto.
A investigação académica explora as memórias dos/as trabalhadores/as que migraram de diferentes regiões do Brasil para construir a capital federal, Brasília (1960), conhecidos/as como candangos/as, e como essas lembranças permanecem vivas nos territórios periféricos do Distrito Federal. O estudo analisa o papel dos processos museológicos comunitários na preservação destas memórias, revelando que, para além das recordações do trabalho e das migrações, as identidades candangas também se constituem através das narrativas de resistência e da luta por habitação digna na capital projetada por Lúcio Costa e Oscar Niemeyer, entre outros nomes renomados do modernismo brasileiro.
A investigação centra-se em três espaços de preservação no Distrito Federal – o Museu Vivo da Memória Candanga, a Casa da Memória Viva da Ceilândia e o Museu Vivo da Memória da Vila Paranoá – para compreender de que forma estes processos desafiam os apagamentos da narrativa institucionalizada sobre a cidade modernista e constroem narrativas em primeira pessoa a partir dos territórios periféricos.
“A memória oficial de Brasília tende a silenciar as histórias daqueles que realmente a construíram. Estas iniciativas comunitárias demonstram que as identidades candangas vão muito além do passado ligado à construção civil: estão diretamente relacionadas com as lutas territoriais que moldaram o Distrito Federal”, explica a investigadora.
Com uma abordagem qualitativa nos campos da Sociomuseologia e dos Estudos Urbanos, a tese analisa documentos, entrevistas e registos audiovisuais para compreender como estas narrativas são construídas e ressignificadas ao longo do tempo. A investigação conclui que a preservação das memórias candangas, mobilizada a partir dos territórios periféricos da capital federal, revela o impacto da luta por habitação na identificação destas populações e funciona como um instrumento de reivindicação social, territorializando novas formas de pertença e identidade.
Para além de contribuir para a valorização da história dos/as candangos/as e das suas lutas, esta pesquisa insere-se num debate mais amplo sobre as consequências sociais dos processos de mercantilização do espaço urbano e da expulsão de populações empobrecidas, migrantes e imigrantes, fenómenos que se repetem em diferentes contextos urbanos contemporâneos. O estudo evidencia como estas populações mobilizam repertórios de resistência para garantir os seus direitos e o respeito pela dignidade humana, sendo que o trabalho com as memórias dos movimentos sociais desempenha um papel fundamental na luta contra os apagamentos históricos. Além disso, a preservação dessas memórias torna-se um poderoso recurso de educação popular, fortalecendo a consciência crítica e promovendo o direito à cidade. A pesquisa também abre espaço para uma reflexão mais ampla sobre o direito à memória e o papel dos museus comunitários como agentes de transformação social, contribuindo para a valorização da história e o fortalecimento das lutas populares na dinâmica socioespacial do Distrito Federal.